Péra... fui rever um rascunho do que ia escrever em janeiro e encontrei esse singelo parágrafo acima.
Depois de pensar que 2019 seria um ano de correção nos mercados, vieram novas máximas. 2020 viria com otimismo sem precedentes.
Apesar do presidente bonobo, acreditava na equipe econômica.
Mas... veio a malfadada pandemia.
Quedas nunca dantes vivenciadas por este investdor que vive o mercado desde 2010.
O pior nem foi isso.
Não poder sair de casa. Não poder praticar meu esporte que tanto prezo. Engordar quilos dantes perdidos com tanto esforço.
No primeiro mês da pandemia por aqui, confesso que fiquei paralisado, estupefato com a situação. Com quase quarenta anos, nunca havia passado por nada parecido.
Mas agora tem que se acostumar com essa situação até passar. Fé em Deus e continuar.
Ressuscitei meu Nintendo Wii pra me movimentar dentro de casa. É o jeito. Agora criar ânimo para levantar uns pesos. Quem sabe um pilates online.
Meu percentual em renda variável chegou a 40% da carteira financeira. Hoje os valores tentam ainda chegar ao que eram no final de 2019, apesar dos aportes deste ano. Depois posto a carteira atualizada.
É isso meus amigos. Tentando voltar a escrever aqui. Fazer um desabafo anônimo de vez enquanto faz bem, que o diga Fernando Pessoa, com seus heterônimos.
Fernando Pessoa - Aniversário
ANIVERSÁRIO
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim mesmo,
O que fui de coração e parentesco,
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino.
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho...)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa.
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
15-10-1929
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993).
- 284.
1ª publ. in Presença, nº 27. Coimbra: Jun.-Jul. 1930.